SOMOS TODAS BRUXAS

Você sabia que a mulher moderna é uma construção social que iniciou com o “Caça às Bruxas”? Que dívida histórica. […]

Você sabia que a mulher moderna é uma construção social que iniciou com o “Caça às Bruxas”?

Que dívida histórica.

Muitos homens historiadores, pensadores se calaram diante desse episódio.

Em que contexto essa barbárie foi permitida?

A quem interessava e ainda interessa o adestramento da mulher?

 

Voce não acreditou nessa história não, né?

Como se constrói um imaginário, uma crença e se faz sustentar por 400 anos?

Pois é…

 

Elas não voavam, não tinham pacto com o diabo, nem feitiçarias e orgias amaldiçoadas.

Quantas crenças sociais, imaginários, verdades construídas com interesses de minorias, manipulam a gente, todo dia?

A história está aí pra nos lembrar e evitar repetições.

Bom, quem eram elas, as Bruxas.

Elas eram mulheres que viviam, produziam e cuidavam dos filhos em comunidade, em atividade comunal.

Conheciam o poder curativo das ervas, faziam poções para curar enfermidades.

Tinham saberes sobre métodos contraceptivos e eram responsáveis pelos partos.

Gerenciavam suas casas, confeccionavam suas roupas e seus bordados.

Junto com seus parceiros produziam os alimentos na lavoura e cuidavam das finanças da família.

Viviam com liberdade e autonomia. Com soberania sobre seus corpos e suas energias sexuais.

Usufruíam com liberdade da força de sua sexualidade, mas não existia as noitadas, os banquete de orgias com Satã.

 

Logicamente elas precisavam ter grandes panelas para alimentar suas famílias   (Caldeirões de Bruxa).

E vassouras de espiga de milho para varrerem a casa ( Vassoura voadora).

Sim, fazer poções com ervas curativas era trivial (Magia) e o conhecimento era passado para as filhas, sobrinhas, amigas (reuniões de grupo para maldições).

Mas não usavam, necessariamente chapéus pontudos, e saíam voando nas sextas feiras de lua cheia.

Os partos dos bebês aconteciam só na presença das mulheres e de seus saberes. Era um momento feminino.

Mas não esquartejavam os recém nascidos para rituais satânicos.

 

Usavam seus conhecimentos para a condução de partos, a cura de doenças e epidemias nos seus povoados e isso acabou despertando o desagrado da instituição médica masculina em ascensão.

Estes elementos cotidianos das mulheres camponesas da Idade Média, foram demonizados à serviço da construção de um imaginário sobre Bruxas.

Assim se dá a construção de crenças sociais que aos poucos vamos internalizando como verdade, nos submetendo a elas, muitas vezes sem nenhuma coerência ou sentido.

O poder da Igreja e do Estado se uniram para controlar a mulher, sua liberdade e sexualidade.

 

A “caça às bruxas” foi, sem dúvida, um processo bem organizado, financiado e realizado conjuntamente pela Igreja e o Estado.

E isso perdura até hoje.

Com a ascensão da Igreja Católica, o patriarcado imperou.

Neste contexto, tudo o que a mulher tentava realizar, por conta própria, era visto como uma imoralidade.

 

Essa construção pautada no tom de desconfiança dos saberes das mulheres, demonização e criminalização de suas vidas cotidianas, condenação pública, mobilizaram muito medo e culpa, fortes dispositivos de controle.

Intensificadas com as cenas máximas de violências e barbárie: Queimadas na fogueira em praça pública.

Estes foram dispositivos sociais usados para adestrar e submeter as mulheres aos interesses econômicos da época e reprimir a sua sexualidade.

A caça às bruxas, foi um capítulo obscuro na transição do mundo medieval para o período moderno, um processo histórico vergonhoso.

A crença na bruxaria desencadeou uma das perseguições mais brutais que o Ocidente já viu.

Por 400 anos, o Estado e as autoridades religiosas da Europa prenderam, torturaram e mataram cerca de 9 milhões de mulheres.

Um verdadeiro genocídio contra o sexo feminino, para manter o poder do Estado e da Igreja, mulheres que ousavam manifestar seus conhecimentos médicos, políticos ou religiosos foram acusadas e punidas.

 

As acusações:

  • Praticar crimes sexuais contra os homens, através de um “pacto com o demônio”.
  • Culpadas por se organizarem em grupos – geralmente reuniam-se para trocar conhecimentos acerca de ervas medicinais, conversar sobre problemas comuns ou notícias.
  • Punidas com a morte na fogueira por possuírem “poderes mágicos”, que provocavam problemas de saúde na população, problemas espirituais e catástrofes naturais.

 

Por trás de um processo histórico obscuro existe razões e intenções econômicas, sociais e políticas. Não somente religiosas:

  • O que era comunal virou privado. O processo violento de usurpação e acumulação de riqueza pela classe burguesa antes do início do capitalismo.
  • Era necessário fragilizar a imagem das mulheres para abafar a revolta dos camponeses contra as atitudes da instalação do Capitalismo.
  • Era preciso tirar a produção comunal das mulheres. A casa precisava ser somente para reprodução e cuidado.  A produção e o de roupas, bordados, alimentos precisava ficar na mão dos produtores capitalistas, bem como o excedente. As empresas produziriam em escala maior e seria vendido para o proletariado. Maior valor ao que era industrializado do que o que era feito manualmente.
  • A autonomia das mulheres começa a ser desconStruída pela idéia de que isso diminuía os homens. Seus domínios e saberes foram criminalizados e demonizados.
  • O controle da sexualidade feminina foi determinante e central.
  • Mulheres foram responsabilizadas por tornarem os homens impotentes.
  • A crença de que as bruxas estavam escravizando-os, escravizou homens e mulheres. Implantou desconfiança e medo nas relações conjugais.
  • Transformou sexualidade em trabalho: Prostituição e Casamento.
  • O adestramento aconteceu para homens e mulheres, mas de forma diferente. Homens perderam suas propriedades comunais, em troca foram apoiados a usar o corpo da mulher e oprimi-la.
  • O capitalismo desqualifica e demoniza até hoje as mulheres.

O feminismo busca resgatar a imagem das mulheres bruxas em nossa história, tanto nos aspectos religiosos, como também políticos e sociais que envolveram a “caça às bruxas” na Idade Média.

As mulheres, através de seus conhecimentos medicinais e sua atuação em suas comunidades, exerciam um contra-poder, dificultando a implantação do patriarcado e, principalmente questionando o poder da Igreja.

Elas foram as grandes vítimas do patriarcado.

Hoje, as mulheres ainda continuam sendo discriminadas e duramente criticadas por lutarem pela igualdade de gênero e a divisão do poder social e econômico, que ainda é predominantemente masculino, continuando assim vítimas do capitalismo e do patriarcado.

Por isto, as bruxas representam para o movimento feminista, resistência, força, coragem na busca de novos horizontes de liberdade.

 

 

A última fogueira foi acesa em 1782, na Suíça.

Porém, a Lei da Igreja Católica que fundou os “Tribunais da Inquisição”, permaneceu em vigor

até meados do século XX.

Será que ainda somos caçadas?

 

Telma Lenzi

 

8 /10 /2020

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