“Quando a gente ama é claro que a gente cuida”.
Parece tão bonita essa verdade que Caetano Veloso cantou.
Mas não é bem assim. Tem um nó nesta história que precisamos desatar.
Amar é diferente de cuidar. Amar é diferente de amor. Amor é um sentimento.
Fácil sentir, impossível definir sem que falte algo. Definir amor é um ato subjetivo e por isso sempre controverso e não consensual.
Distante das discussões teóricas foi cantado e proseado desde Luís de Camões:
“Amor é fogo que arde sem se ver; é ferida que dói e não se sente; é um contentamento descontente; é dor que desatina sem doer.”
Amar, diferente de amor, é um verbo, uma ação, uma atitude.
Em tempos de amar contemporâneo, precisamos diferenciar amar de cuidar.
Amar é estar com o outro em sua dignidade, no direito à sua singularidade e às suas escolhas de formas de vida.
Amar acontece em uma história construída que, com o tempo, vai além da atração física, passando para uma preocupação com o bem-estar do outro para o seu próprio bem-estar, com cumplicidade, intimidade e companheirismo.
Amar gera uma influência mútua, no qual a (in) felicidade de um causa a (in) felicidade do outro.
O cuidar aparece, mas não é o tema da história. É situacional, quando for necessário. Um não tem que fazer algo sempre pelo outro. O bom é estar com o outro.
Quando misturamos amar com cuidar, a paisagem muda.
O cuidar é contínuo. Aqui, quem ama cuida como na música.
Os cuidadores querem colonizar um ao outro, não aceitando suas singularidades.
As motivações partem de pensamentos amorosos, mas desqualificadores: eu sei e posso ensinar para ele.
Eu sei o que é melhor para ela.
Eu sei mais do que ele.
E nesta hierarquização de competências, quem pode mais, quem sabe mais, quem é mais forte, cuida do outro.
O conflito é inevitável porque nunca saberemos o que é melhor para o outro melhor do que o próprio outro?
Reina a paz enquanto um cuida e o outro aceita e ambos se deleitam com essa hierarquia.
O conflito se instala quando os cuidandos crescem, e começam a buscar uma relação igualitária de mais autonomia, menos controle.
Os cuidadores, por outro lado, não vão abrir mão de um espaço conquistado e iniciam a luta para continuar no controle.
Outro itinerário do conflito é quando os cuidadores cansam e se irritam com as desobediências dos cuidandos e iniciam caminhos sem volta gerando violência.
Por amar desta forma, cuidam.
Para manter o cuidado, controlam.
E este controle que cansa ambos, vai virar pressão, vai virar violência psicológica, violência verbal, podendo chegar na violência física.
E desta forma, não será mais possível avistar o sentido original de amar e cuidar.
Ele transformou-se em violência e conjugou amar com sofrimento.
Cena final:
Os cuidadores definidos como os vilões da história, sem entender nada, seguem sozinhos com seus sentimentos de incompreensão, raiva e abandono profundo.
E os cuidandos? Eles seguem procurando outros pares complementares, ou então com um pouco mais de empenho, cresceram e estão hoje em relações igualitárias.
Escolha o enredo para você caminhar na sua história de amar.
Se o caminho não está agradando, transforme-o. Use seus personagens internos.
Você pode ser o autor, que ao mesmo tempo dirige você como ator em sua vida.
Proponho outra melodia:
“Só há amor quando não existe nenhuma autoridade”. Raul Seixas
Telma Lenzi| Junho de 2013
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