As estórias dos vizinhos do Movimento

Quem assiste de fora, família, amigos, sempre ficam muito curiosos a respeito das atividades e formato do Curso de Formação Sistêmica do Movimento. As famílias ficam com vontade de saber mais do curso. E os vizinhos também.

Já pensaram no que os vizinhos vêem e escutam? Duas vizinhas e comadres das duas casas do lado da antiga sede da Rua Hermann Blumenau conversam:

– Nós estamos aqui debruçados na janela vendo o caminhão que tá fazendo a mudança da Clinica  Movimento.  Essa casa ai do lado… casa de maluco aqui, oh.  Mudança  bem no Carnaval.

– Hummmm!!!! La vão eles embora. Tanta coisa que tinha lá dentro, né?

– É!!!

– Uma clínica, um curso para Psicólogos e uma ONG.

–  Já existe a muito tempo?

– Diz ali desde 1987.

– Mais de 20 anos então. O que que eles fazem mesmo?

– Prometem mudar os coitados que querem ser Psicólogos Sistêmicos para depois eles fazerem igual com as pessoas.

– Isso que deu pra entender. Mas o que será que significa este nome: Formação Sistêmica? Sistêmica ou Satânica? A placa tá meio apagada. Ah era Satânica mesmo.

– Porque o símbolo que eles usam, é um tridente. Diz que é símbolo dos psicólogos parece um tridente de diabo. Vai ver que é ligado no demo mesmo.

– Hummm…

– E dura mesmo três anos?

– O quê?

– O tal do curso pra mudar os pobres? Demorado, né? Como será isso de mudar os alunos? Estranho, né?

– Pior. Diz que o mais incrível é que as famílias dos alunos também mudam.

– Hummm!!

– Os parente que ficam aqui pela frente esperando os encontros acabarem sempre comentam que a mulher (marido, filha, mãe) tá mudada.

– Mudada pra melhor ou pior? Ah!!! Isso que eu queria saber!

– Tem marido que fica de plantão no carro esperando. A coisa pode degringolar e daí ele deve querer salvar a mulher, né?

– Falam tanto desses professores… o que eles fazem pra mudar os alunos?

– Sei lá.

– Às vezes fazem tanto barulho, riem alto, gritam, brigam, choram.

– Pior é quando fazem aquela história de se agarrarem em círculo e  gritarem Rá…Rá… Rá bem alto e saem todos abraçados. Coisa de gente doida.

– Fazem fogueira no meio e queimam papéis escritos alguma coisa estranha. às vezes já sopraram na janela as cinzas. Pode?

– Às vezes saem chorando dá pra pensar que não vão voltar mais. Tem aluno que vai embora e… depois volta. E aquele dia que ficou um trancado depois que a aula acabou? Será castigo?

– Tem aluno que foi embora e vem visitar. Outros viraram notícia, dão entrevista na TV, são famosos.

– Tem aluno que não quer ir embora e daí vira professor, coordenador, comandante do tal G.E.

– Ah! Esse é famoso.

– G. E.  e abreviatura de general, né?

– Deve ser.

– E a tal Thaís que comanda o G.E.?

– Ela é da polícia ou Psicóloga? Como ela comanda a tropa do tal G.E.?

– Não sei, ela vive rindo não tem cara de durona não. Se não é policial não deve funcionar. Então deve ser uma bagunça.

– Não escutas a gritaria? Então…

– E a outra tal de Cláudia? Um dia eu espiei.Tu não vai acreditar. Ela dando aula e obrigando os alunos ficarem de olhos fechados.

– Por quê? Não queria que eles olhassem pra ela?

– Olha. Sei não. Ela tava descalço. Pode ter esquecido o sapato e não queria que ninguém visse. No fim quem obedeceu ela deu uma flor pra cada um.

– É pode ser. Mas já vi outros alunos e professores que não usam sapatos.

– O que? Que coisa estranha…

– Tem muita coisa estranha.  Tem aluno filho de aluno.

– Sei até os nomes: Uma tal de Nara e um Bruno. Vai ficando tudo junto por aqui.

– Tudo grudado.

– Parece que pra ser professor precisa ter sido alunos. E será que precisa por os filhos também?

– Deve sim. Aceitam de todas as idades. Tens uns que começam bebês. Teve uma aluna de meses no fim do ano uma tal de Sofia.

       – Então aceita aluno criança e aluno adulto?

        – É pra tu vê que bagunça.

– Eu tava dando uma espiada lá de cima esses dias. E vi com meus olhos. A tal da aula, não era aula nada, era uma mercado              de verdade.  Os alunos vendiam suas coisas e cobravam dinheiro.

– Uma outra vez cada um tinha que doar coisas suas especiais para treinar um tal de desassossego ou desapego. O que será isso?

– Pra complicar um pouco, cada um descobre que tem 10 personagens dentro de si mesmo e diz que isso e muito bom.

– Falam que todos têm uma louca e um General?  E uma Cigana e um Cigano pra fazer aquilo.

– Hummm, o que? Mas que história é essa?

– Bom…Nem queria tocar no assunto…mas lembra do ano passado?

– Qual?

– Aquele dia? Das músicas e danças de cigana?

– Ah! Melhor nem pensar no que deu.

– Eu revirei o lixo e li o panfleto. Deixa eu ir buscar.

– Oh! Tá aqui: DESEJO FEMININO. Não tô inventando não. Tá aqui: só pras mulher treinar aquilo (vou falar baixo: SEXO)

– Isso tem outro nome. Que pouca vergonha!

– Treinar …  E vão usar como? Hum…Tá mal explicado.

– Ou muito bem explicado. Tudo Depravado.

– Era esse dia que tinha uma vela, né?

– E péra aí: olha essa aqui.

– Ué? Como é que tu tens uma vela dessas? Um homem e uma mulher pelado enroscado?

– A faxineira dos Satânicos me contou e pedi pra ela comprar pra mim?

– Mas pra quê?

– Diz que quando acende a vela e canta em outra língua assim ó: XIM ALEFI REIM. Atrai namorado e quem já tem amansa marido. Por vias das dúvidas comprei uma pra mim.

– Ó!!! Não sou de ferro não.

– Quem faz as velas é o filho da dona? Aprendiz de bruxaria.

– Como é que tu sabes?

– Eu também comprei uma pra mim.

– Ué? Mas tu não queria ficar solteirão.

– É, queria, mas andei conversando ai com uma delas e tô pensando outras coisas.

– Tu já foi lá?

– Não, não. Só numa tal palestra pra aprender a amar.

– Tu me surpreendeu, compadre. E eu aqui só na vontade. Nunca pus os pés lá.

– Nem deve mesmo. Não são bem certos eles.

– E essa história de catar fotos da família toda e ficar contando os segredos? Falaram que duas vezes por ano, passavam um fim de semana em retiro, dormiam tudo junto com as tais fotos das famílias. E pior que de tanto rezar nesse tal retiro, uns alunos se transformam em Anjos.

– Anjo de verdade? Não voltavam mais ao normal?

– Sei lá. Falaram que não. Desaparecem. A faxineira que foi embora disse que não aguentou tanta maluquice. Coitada fugiu. Ela escutava essas coisas e vinha contar pra mim. Ela morria de medo delas. Não tinha material de limpeza. Diziam que o bom era limpar a casa com incenso. E as músicas? Parece música do alem.

– Quase certo que fazem bruxaria.

– So pode se é mulher, mas tem uns homens sim, que eu vi. Quando os alunos começam a fazer consulta no tal terceiro ano do curso, não é um terapeuta com um cliente como é o normal pra ser se eles fossem Psicólogos. Falam, não sei se é bem verdade, que tem vezes que é um cliente e 7 , até 8 terapeutas. Tudo junto. Falando tudo junto. E que no ano passado em um  grupo de mulheres escutaram cantos e danças de índio. Dança e gritos de guerras.

– Isso já deve ser invenção, mas…

– Só sei que não tem prova pra passar de ano.  Tem trabalho final que eu vi –  que era era uma toalha de renda, almofadas, caixas, quadros.

– Será que não é um curso de artesanato que tem junto então?

– Já foi pior … nem tinha carteira de aula, agora vai ter. Até o ano passado eram almofadas e todo mundo jogado no chão. Podia até dormir que os professores não brigavam, não. Eles dizem que  todos são livres, que não tem certo e errado.

– Então pode fazer tudo o que querem? Que maluquice.

– A gente como vizinho tem que aceitar isso tudo. Um abuso.

– As secretarias entram ficam pouco tempo, só uns meses, tem sempre uma nova. Fazem terapia de graça com as Psicólogas até descobrirem o que querem da vida e vão embora. Uma virou gerente de loja do shopping, outra virou advogada. Muitas foram fazer psicologia. Como é que pode?

– Ainda bem que essa gente não fica muito tempo no mesmo endereço.

– É. São Ciganas. Já é a quarta casa que estão indo.

– Dizem que a dona adora obra. Ela é arquiteta e só depois fez curso de Psicóloga. O trabalho dela de verdade é restaurar casa tombada, casa velha, destruída. Todo mundo que tem casa pra reformar oferece para ela alugar. Não vê essa que estava caindo aos pedaços como ficou bonitinha? E todo mundo da rua começou a melhorar as suas casas. Hoje a rua tá toda bonita. Cada casa de uma cor. Isso ela colaborou. Agora como atendem muita gente de graça precisaram de uma casa maior. Ou melhor duas casas pra dar conta. Tinha noite que a rua ficava cheia de gente esperando o tal General G.E.

– Será o tal de dentro da cabeça que falam que todos tem?

– Deve ser sim.

– Sabe da última deles? A  casa que eles vão mudar agora é roxa.

– Roxa?

– Isso mesmo toda roxa.

– Cruz credo cor de quaresma?

– Quaresma que nada comadre  Cor de Puteiro!

– Cruz credo… Melhor que vão duma vez.

– Que vão em paz, pra longe de nós, né?

– É…

– Mas quem cria uma ONG pra atender de graça essa gente toda pessoa ruim não é.

– Olha! Não da pra entender não. Se são do bem ou do mau.

– A gente nunca viu bandalheira. Só maluquice e bruxaria.

– Devem ser boas pessoas apesar de serem esquisitões. Todo Psicólogo é maluco mesmo, né?

– É.

– Péra, deixa eu falar com a secretária pra pegar o número do telefone novo deles caso a gente precise, né?

– Lá vai o caminhão embora!!!

– É… Vão fazer falta…Era uma movimentação danada alí. A  rua não vai ser mais a mesma…

– É… Vai ser uma calmaria chata.

 

Telma Lenzi | 2010